“Matarás um Culpado e Dois Inocentes” é o décimo trabalho do jornalista e escritor e é editado pela Leya (Dom Quixote).

O começo é impactante: na pequena aldeia de Gondarém, nos anos 70, três irmãs aparecem mortas. Uma quarta, por sua vez, desapareceu. Elas viviam num casarão abastado da localidade, filhas de um casal rico do Porto que por lá resolvera se instalar. Mas, apesar deste evento nada desprezível, ainda há um outro maior que o submerge na perceção local: as irmãs têm o seu destino fatal no mesmo dia do 25 de Abril, em 1974. Assim, o que era para ter sido um enorme choque para a localidade, termina por passar mais ou menos em branco. 

As irmãs eram benquistas na aldeia, mas não totalmente isentas daquelas loucas fantasias das mitologias rurais: uma era suspeita de falar com os animais, a outra com os mortos, uma terceira de entender os loucos. 

Tudo muda muitas décadas depois quando, no entanto, o 25 de Abril já faz parte da rotina e, de súbito, aquelas incómodas memórias começam a fervilhar aqui e ali pelas conversas de café na pachorrenta vida da aldeia. Os mais velhos, que têm presente na mente a convivência com a família e com aquele súbito desaparecimento, começam a sentir algum remorso por, afinal, não terem sentido o luto que as meninas mereciam. É então que alguém da Câmara resolve fazer uma homenagem para assinalar a data.

Quem ainda está bastante vivo e numa espécie de limbo emocional com os acontecimentos (“Morri no dia em que morreram as minhas irmãs. A única diferença é que continuei a respirar”, diz na primeira frase do livro Miguel Serafim), é o irmão que, na altura das mortes, era uma criança a estudar na capital. Com o passar dos anos e de dores atenuadas, vive a sua vida até que os seus dois melhores amigos resolvem lhe contar um terrível segredo – reavivando todo o passado duramente enterrado.

O jornalista Rodrigo Guedes de Carvalho resolveu dar uma sequela ao seu romance do ano passado, “As Cinco Mães do Serafim” – indo lá buscar, por exemplo, o seu protagonista Miguel Serafim Temeroso, o Maestro, como é conhecido, e a sua mãe, a mulher de aço (para o bem e para o mal) Maria Virgínia. O título vem de uma constatação de um dos protagonistas – de que para cada vingança serão mortos um culpado mas dois inocentes – como a revelar a proporção de injustiça profunda que caracteriza a vida humana. É o décimo romance do escritor, que iniciou em 1992 com o livro “Daqui a Nada”. 

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