Cristo reza no Jardim Getsemani, pintura de Hermann Clementz

O livro é editado pela Leya, chancela Dom Quixote. 

“…este romance defende que Jesus foi o homem mais fracassado da civilização ocidental: morreu consciente de que não tinha o amparo do Pai (“Pai, pai, por que me abandonaste”?), tudo o que profetizou não só não se cumpriu como deu origem à religião mais violenta do mundo (em seu nome tivemos 2000 anos de guerras bárbaras), como, ainda, as “Bem Aventuranças” que “visionou” nunca tiveram existência concreta, embora tenham dado origem a toda a literatura utópica”.

Com este ponto de partido, conforme descrito logo na Introdução, Miguel Real, que acrescenta mais um título de uma vasta obra de ficção e ensaios onde por vezes se detém em temas como a igreja, o pecado e Fátima. “Autobiografia de Jesus” mergulha o leitor num imaginário da Antiguidade Oriental construído com riquezas de detalhes – os nomes dos locais da árida Palestina, o pano de fundo das lutas entre grupos “guerrilheiros” de oprimidos contras as classes judaicas ricas e os próprios romanos (que seriam igualmente os atores ligados à crucificação), a extrema pobreza especialmente da classe rural e as descrições das paisagens animal e vegetal que se adivinha existirem por estes tempos.

Ao mesmo tempo que vai preenchendo as lacunas de uma história, curiosamente em função do alcance que tem, nunca devidamente desenvolvida pelos enredos bíblicos, o escritor cria um narrador que, em primeira pessoa, revela-se sempre sorumbático, cabisbaixo e perplexo diante de um mundo onde grassa a crueldade e a injustiça. O Jesus de Miguel Real está longe de um homem sereno, cuja sabedoria o colocou acima das vicissitudes “farisaicas”: aqui nem com a sua capacidade de operar milagres (com a sua mão direita) Jesus parece animar-se com uma humanidade tão pouco promissora. Os episódios bíblicos conhecidos cruzam-se aqui e ali com construções inovadoras que tentam conceder uma história para esta personagem tão mal conhecida.

Sobre a igreja, escreve ainda o autor: “Pressionado pelas injustiças do seu tempo, as suas palavras deram origem à instituição mais poderosa e mais injusta, grosseira, interesseira, calculista e violenta de toda a civilização ocidental…”

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